«Foi um Verão como este - inválido, sonso, em quartos
desabitados, o zumbido das varejeiras e dias por escandir,
gatos que apareciam imprevistos e olhavam de esguelha,
o estouro plebeu de anilhas de latas de cerveja. Um livro
nas mãos que se folheia para alongar o desejo que se tem de o ler.
No comboio duas raparigas a quem muito os óculos roubavam
graça, pararam de conversar quando eu entrei. Sorri de embaraço
e partilhei o banco: figurantes sem graça, nem pena, que cabeceavam.
Finalmente todos comungámos a modorra de quem vai em
noite de Verão para um local tão insondável como Amadora
ou Cacém. Ainda que tentasse ler, de novo os olhos se erguiam
para a mão triste que suspendia um gesto, para o olhar que retribuía
a súplica: por que estamos tão perto de chegar, por que simular
enfado, por que parou o comboio, o que vai acontecer?»
José Alberto Oliveira, 1997
9 de janeiro de 2010
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